As cidades perdidas da Amazônia VII

A identificação de grandes núcleos populacionais murados, espalhados numa área comparável à de Sergipe, sugere que havia, no mínimo, 15 agrupamentos espalhados pelo Alto Xingu. Entretanto, como a maior parte da região não foi estudada, a quantidade correta pode ter sido muito superior. A datação por radio-carbono dos sítios já escavados sugere que os ancestrais dos xinguanos chegaram à região, vindos do oeste, e começaram a modifi car as florestas e a zona úmida a seu critério cerca de 1.500 anos atrás ou até antes disso. Nos séculos que antecederam a descoberta da América pelos europeus, os sítios foram reformados, passando a compor uma estrutura hierárquica. Os registros existentes chegam apenas até 1884, portanto os padrões de povoação acabam sendo a única forma de estimar a população pré-colombiana; a escala dos povoamentos sugere uma população muito superior à atual, chegando de 30 a 50 mil indivíduos.

Cidades-Jardins da Amazônia
Há um século, o livro Garden cities of tomorrow (Cidades-jardins do futuro), de Ebenezer Howard, propôs um modelo para um crescimento urbano sustentável de baixa densidade populacional. Um precursor do movimento ecológico atual, Howard idealizou cidades interligadas como uma alternativa para um mundo industrial, repleto de cidades com arranha-céus. Sugeria dez cidades com dezenas de milhares de habitantes, que teriam a mesma capacidade funcional e administrativa que uma só megacidade.

Os antigos xinguanos parecem ter construído esse sistema, um tipo de urbanismo de estilo verde ou protourbanismo – uma incipiente cidade-jardim. Talvez Percy Fawcett estivesse no lugar certo, mas com o foco equivocado: cidades de pedra. O que faltava aos centros em termos de pequena escala e elaboração estrutural, os xinguanos conseguiam alcançar pela quantidade de cidades e por sua integração. Se Howard tivesse conhecimento de sua existência, poderia ter-lhes devotado um trecho no Garden cities of yesterday (Cidades-jardins do passado). O conceito comum de cidade como uma densa rede de prédios de alvenaria remonta à época das antigas civilizações dos oásis nos desertos, como na Mesopotâmia, mas que não possuíam as mesmas características ambientais. Não só as florestas tropicais amazônicas, como também as paisagens das florestas temperadas da maior parte da Europa medieval, eram pontilhadas por cidades e vilarejos de tamanhos similares a essas no Xingu.

Essas visões são especialmente importantes na atualidade por causa da retomada do desenvolvimento do sul da Amazônia, desta vez pelas mãos da civilização ocidental. A floresta do sul amazônico, em transição, está se convertendo rapidamente em áreas cultivadas e de pastagens. Seguindo o ritmo atual, no decorrer da próxima década a floresta se reduzirá a 20% de sua área original. Muito do que resta fi cará restrito a reservas, como as do Xingu, onde os povos indígenas são os comandantes da biodiversidade restante. Nessas áreas, sob muitos aspectos, a salvação das florestas tropicais e a proteção da herança cultural indígena são partes de um só todo.

 Fonte: Scientific American Brasil Online

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